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6/02/2018

MIGUEL TORGA (Portugal, 1907-1995)
A um negrilho

Na terra onde nasci há um só poeta.
Os meus versos são folhas dos seus ramos.
Quando chego de longe e conversamos,
É ele que me revela o mundo visitado.
Desce a noite do céu, ergue-se a madrugada,
E a luz do sol aceso ou apagado
É nos seus olhos que se vê pousada.

Esse poeta és tu, mestre da inquietação
Serena!
Tu, imortal avena
Que harmonizas o vento e adormeces o imenso
Redil de estrelas ao luar maninho.
Tu, gigante a sonhar, bosque suspenso
Onde os pássaros e o tempo fazem ninho!

Negrilho (Ulmus minor), árvore muito vulgar antigamente em Trás-os-Montes, tem vindo a desaparecer progressivamente, dizimado pela "Grafiose do Ulmeiro", restando alguns troncos que, apesar de secos, ainda têm valor ecológico, servindo de suporte de ninhos de cegonhas.
Foi uma destas árvores que inspirou Miguel Torga, no seu poema “A um negrilho”, o velho negrilho que existia no Largo do Eiró, em S. Martinho de Anta onde nasceu.

Desse negrilho resta, apenas, o tronco morto e, junto dele, a poesia que o imortalizou e o busto do poeta e escritor transmontano.


Fotos de Manuela D.L.Ramos 2010
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7/21/2017


OLAVO BILAC (Brasil, 1865-1918)
Crepúsculo na mata

Na tarde tropical, arfa e pesa a atmosfera.
A vida, na floresta abafada e sonora,
Úmida exalação de aromas evapora,
E no sangre, na seiva e no húmus acelera.

Tudo, entre sombras, -o ar e o chão, a fauna e a flora,
A erva e o pássaro, a pedra e o tronco, os ninhos e a hera,
A água e o réptil, a folha e o insecto, a flor e a fera,
-Tudo vozeia e estala em estos de pletora.

O amor apresta o gozo e o sacrifício na ara:
Guinchos, berros, zenir, silvar, ululos de ira,
Ruflos, chilros, frufrus, balidos de ternura...

Súbito, a excitação declina, a febre pára:
E misteriosamente, em gemido que expira,
Um surdo beijo mormo alquebra a mata escura...
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12/01/2016

ANTÓNIO GEDEãO y los árvores

ANTÓNIO GEDEãO (Portugal, 1906-1997)
"As folhas dos plátanos"

As folhas dos plátanos

desprendem-se e lançam-se na aventura do espaço,

e os olhos de uma pobre criatura

comovidos as seguem.

São belas as folhas dos plátanos

quando caem, nas tardes de Novembro

contra o fundo de um céu desgrenhado e sangrento.

Ondulam como os braços da preguiça

no indolente bocejo.

Sobem e descem, baloiçam-se e repousam,

traçam erres e esses, cicloides e volutas,

no espaço escrevem com o pecíolo breve,

numa caligrafia requintada, o nome que se pensa,

e seguem e regressam,

dedilhando em compassos sonolentos

a música outonal do entardecer.

São belas as folhas dos plátanos espalhadas no chão.

Eram lisas e verdes no apogeu

da sua juventude em clorofila,

mas agora, no outono de si mesmas,

o velho citoplasma, queimado e exausto pela luz do Sol,

deixou-se trespassar por afiado ácidos.

A verde clorofila, perdido o seu magnésio,

vestiu-se de burel,

de um tom que não é cor,

nem se sabe dizer que nome tenha,

a não ser o seu próprio,

folha seca de plátano.

A secura do Sol causticou-a de rugas,

um castanho mais denso acentuou-lhe os nervos,

e esta real e pobre criatura

vendo o solo coberto de folhas outonais

medita no malogro das coisas que a rodeiam:

dá-lhes o tom a ausência de magnésio;

os olhos, a beleza.
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10/14/2014

CAMILO CASTELO BRANCO (Lisboa, 1825-1890)
A "acácia" do Jorge

de Dias com árvores

Jorge, o "filho louco" de Camilo Castelo Branco, plantou em 1871, tinha então 8 anos, uma árvore junto à escadaria de pedra no terreiro da casa de S. Miguel de Seide. A esta árvore se refere Camilo várias vezes, como em Durante a febre:

Quando a Acácia do Jorge ainda outra vez inflore,
Chamai-me, que eu de Abril nas auras voltarei
.

A árvore não é uma acácia, mas uma robínia. Um deslize em taxionomia que não ofusca o apego de Camilo ao convívio com a natureza, alimentado pelas léguas palmilhadas desde a infância em pedregosas ladeiras de serra. Camilo chegou a ser um peregrino convicto de arvoredos, córregos e morros de terra agreste, aldeias, costumes e lendas populares, que depois transfigurou em palco de prosa admirável.
Estas árvores são minhas amigas há vinte e sete anos.
Vim hoje aqui despedir-me delas: creio que para sempre me despeço.
Tenho que abraçar as mais diletas e confidentes: umas que já eram velhas quando, em minha infância, as vi; outras, que eram tenras então, e agora bracejam frondes de luxuriante mocidade. Eu já encaneci; e elas verdejam exuberantes de seiva.
Faço trinta e oito anos, inclinado à sepultura; e elas têm três séculos que viver, trezentas primaveras para se vestirem de galas novas. Meus netos virão saborear-se em vossas sombras, ó carvalheiras, ó verdes pavilhões que me cobristes nas máximas tristezas e alegrias de minha vida!
Seria engodo ao riso andar-me eu aqui abraçando árvores, se alguém me visse
...

O excerto que aqui coloquei em itálico é do início da novela de Camilo, "No Bom Jesus do Monte", que conta a história de Fanny Owen.

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6/09/2013


JORGE SOUSA BRAGA (Oporto, 1956)
As ávores e os livros


As árvores como os livros têm folhas

e margens lisas ou recortadas,

e capas (isto é copas) e capítulos

de flores e letras de oiro nas lombadas.

E são histórias de reis, histórias de fadas,

as mais fantásticas aventuras,

que se podem ler nas suas páginas,

no pecíolo, no limbo, nas nervuras.

As florestas são imensas bibliotecas,

e até há florestas especializadas,

com faias, bétulas e um letreiro

a dizer: «Floresta das zonas temperadas».

É evidente que não podes plantar

no teu quarto, plátanos ou azinheiras.

Para começar a construir uma biblioteca,

basta um vaso de sardinheiras.
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